Espectáculo deprimente no “Sexta às Nove”

Sexta às nove

“O programa ” Sexta às nove  da RTP3” debateu esta noite as violações do segredo de justiça. O trabalho de investigação feito para o programa foi elucidativo na identificação dos responsáveis de processos em que ocorreram violações do segredo de justiça: um jornalista da revista Sábado, o procurador Rosário Teixeira e o juiz Carlos Alexandre. O programa foi mais longe no estabelecimento de relações entre estes protagonistas, sugerindo proximidade e, implicitamente, promiscuidade na passagem de informação a troco de promoção de uma imagem mediática positiva em entrevistas e peças jornalísticas com citações de “estados de alma” do “super-juiz”.

Quando o programa passou para o debate com a presença de dois jornalistas e dois advogados, a coisa descambou. Eduardo Dâmaso, director-adjunto do Correio da Manhã, e Felícia Cabrita, jornalista do Sol, abandonaram a posição de jornalistas para se posicionarem ao lado da acusação. Foi então possível verificar até que ponto a discussão sobre o processo Sócrates está inquinada  e extremada. Sandra Felgueiras, a moderadora do programa, foi incapaz de conter a agressividade dos dois jornalistas contra o advogado de José Sócrates, Pedro Delile que a custo conseguiu falar, sempre atropelado por Felícia Cabrita. No final do programa, a discussão extremou-se  com acusações reciprocas entre o advogado e os dois jornalistas.

Independentemente dos argumentos de cada uma das partes, o que choca é verificar a completa ausência de imparcialidade dos jornalistas em questão, que não escondem a sua plena convicção da culpabilidade de José Sócrates sem qualquer concessão ao seu direito à presunção de inocência. Ouvindo estes dois jornalistas percebe-se que o alegado “interesse público” com que justificam a publicação de notícias  nos seus jornais contra Sócrates não é mais do que uma luta que travam para afirmação das suas posições no sistema mediático e na preservação das suas ligações a elementos do sistema judicial de quem são autênticos porta-vozes e de quem dependem para alimentarem um permanente fluxo de notícias sobre o processo. O vigor com que defendem as teses do Ministério Público mostra que a sua luta se confunde com a da acusação e esta precisa de fazer caminho nos jornais “amigos” para que a ajudam a “provar” o que ainda não conseguiu transformar em acusação formal.

É um interesse recíproco o que une os jornalistas empenhados na acusação a Sócrates e os magistrados que precisam que o processo continue nas primeiras páginas dos jornais, alimentando, por um lado, as percepções dos portugueses e, por outro, a convicção dos que irão julgar Sócrates.

Foi um programa muito elucidativo, embora deprimente  para quem espera do jornalismo e dos jornalistas uma conduta que não se confunda com marionetas ao serviço da investigação judicial.

Ouvir Eduardo Dâmaso e Felícia Cabrita falarem do processo como se o tivessem “em casa”, juntando pormenores e referindo-se à vida de Sócrates como se fossem eles os polícias que ouvem as escutas e fizeram as buscas, ou os magistrados que fizeram os interrogatórios a Sócrates, é assustador!”

Estrela Serrano

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